Uma coisa puxa outra…
No meio de tantos caminhoneiros não me passou desapercebido o número significativo de mulheres no volante de caminhões.
Sim. Elas são caminhoneiras. Braços musculosos, entendem de mecânica e têm ouvido sensível à qualquer ruído no motor.
Quando a vi atravessando o pátio de estacionamento falando no celular, com uma chave de pendurada no pescoço, foi fácil deduzir que ela era mais uma das tantas que eu já tinha visto.
Abordei e perguntei se era caminhoneira. Ela confirmou que sim.
_Posso conversar com você?
Sorrindo respondeu sim.
_Dentro do seu caminhão?
_Claro vamos ali.
Entramos, me apresentei e ela foi se desculpando pela bagunça…rsrsrs. Bem se vê que não me conhece.
A resposta à primeira pergunta me deixou muda.
_Você é de onde?
Ao que ela respondeu:
_Sou de Joinville.
É muita coincidência. Mas não lhe disse, de imediato, que eu também morava em Joinville, para não inibi-la. Muita inocência, a minha.
Ela falou com propriedade, firmeza e desenvoltura. Convincente do prazer que tem pela profissão.
Esta é Letícia. Uma #superlinda caminhoneira. Gaúcha, separada, 42 anos, mãe de um filho de 18 anos, filha de pai caminhoneiro. Não precisa dizer mais nada. Está na genética.
Sorridente, simpática e falante. Sem a menor resistência falou da profissão, da sua vida pessoal e amorosa, da sua vaidade.
Disse que saiu da função que tinha no escritório da empresa do marido, após a separação e optou por essa profissão porque gosta de liberdade. O primeiro caminhão que dirigiu foi um do Corpo de Bombeiros Voluntários de Araquari (SC) tornando-se a primeira mulher motorista da corporação. Trabalhou como empregada/motorista de outras duas empresas em Joinville, até que decidiu por comprar seu próprio caminhão com financiamento bancário que ainda está pagando.
Me mostrou sem a menor preocupação as notas de frete para conferir a quantidade de toneladas que estava transportando.
Mesmo tendo passado por dois momentos de perigo no exercício do seu trabalho, não pretende trocar por outra profissão mais segura e pacata. Há um ano sofreu um acidente na serra de Curitiba que a deixou 6 meses sem poder trabalhar. Em outro momento sofreu um sequestro por assaltantes que roubaram a carga que transportava. Duas situações que exigiram tratamento médico e psicológico para dar continuidade à sua vida profissional.
A vida dentro do caminhão, posto de combustível e a estrada é um desafio compensador. Adrenalina necessária na sua vida. Gosta de estar sempre em lugares diferentes, conhecer e conversar com as pessoas que vai encontrando.
Sua relação com os caminhoneiros homens é muito normal. Pelo cruzamento de olhares consegue entender se o “cara” está olhando para ela como profissional ou mulher e este entendimento faz toda a diferença na forma como ela vai se dirigir àquela pessoa. Ou como ela mesma disse:
_Passo reto sem dar a mínima chance daquele homem se aproximar.
Já teve relacionamentos afetivos com homens da mesma profissão que a sua, como qualquer outra mulher de diversos setores de trabalho.
A vaidade feminina está a olhos vistos. Brincos de pérola, corrente dourada, pele bronzeada, adora dançar. E disso se aproveita quando viaja para o Nordeste. Entre uma espera e outra para descarregar ou carregar o caminhão, ela própria faz e pinta suas unhas, seus cabelos, faz a sobrancelha e depilação.
Perguntei:
_Mas como você faz tudo isso sozinha?
_ Ahh…dou meu jeito.
Letícia, você é mais uma grande personalidade que conheci.
Obrigada pela sua conversa, disponibilidade e simpatia.
Boa viagem caminhoneira!